Alan Ricardo Duarte Pereira*
O presente trabalho tem como objetivo analisar o medo à liberdade conforme foi
conceitualizado e teorizado por Erich Fromm (1900-1980). E, de forma sucinta, buscaremos
expor as concepções teórico-metodológicas de Fromm. Para isso, visamos analisar
uma das principais obras que Erich Fromm expõe minuciosamente a problemática da
liberdade, cognominada de O medo à
liberdade. Num primeiro momento, buscaremos expor o contexto
histórico-político de Fromm, juntamente com a Escola de Frankfurt, depois partiremos
para a análise que o autor faz do conceito de liberdade e, por fim, destacaremos
as problemáticas e implicações em torno do medo
à liberdade na sociedade capitalista.
O
psicanalista Erich Fromm tem uma obra vasta sobre psicanálise e marxismo, entre
esse obras temos, principalmente, Análise
do Homem, Conceito marxista do Homem, O
coração do Homem , A crise da Psicanálise,
Meu encontro com Marx e Freud, A missão de Freud , Psicanálise da Sociedade Contemporânea , além dessas obras existem duas
tratando- se do conceito de liberdade, O Espírito
da Liberdade e O medo à liberdade.
As duas últimas obras, neste artigo, serão resgatadas- e principalmente a obra O medo à liberdade - para analisarmos o conceito
de liberdade em Fromm.
A
escola de Frankfurt e a teoria crítica
Primeiramente,
para que se entenda as reflexões de Fromm sobre o conceito de liberdade, tornar-se-á
necessário buscar suas fundamentações na chamada Escola de Frankfurt. O instituto
foi fundado na cidade de Frankfurt, na Alemanha, em 1923, ligado à Universidade
de Frankfurt. Os integrantes dessa escola foram Max Horkheimer, Theodor W.
Adorno, Herbert Marcuse, Walter Benjamin, Erich Fromm, entre outros. Essa escola
buscou preencher algumas lacunas do marxismo tradicional, “extraindo” suas teorias
dos mais diversos campos (psicanálise, filosofia, existencialismo, sociologia,
história), sintetizando trabalhos como de Hegel, Kant, Lukács e principalmente,
de Marx e Freud. Criaram, assim, o
que foi considerado de “Teoria Crítica da sociedade”. Conforme aponta Matos (1993) em seu livro sobre a Escola de Frankfurt, “a Teoria Crítica realiza uma incorporação do pensamento de filósofos “tradicionais”, colocando-os em tensão com o mundo presente” (MATOS, 1993, p.13).
É importante observar que essa mesma escola não somente
refutou as obras de alguns autores, mas, simultaneamente, incorporou uma gama
de pensamentos, reformulando, por sua vez, as abordagens tradicionais, assim, pode-se
considerar que os
Membros filiados
a essa escola objetivaram realizar uma sistemática crítica ao positivismo e à racionalidade
iluminista. Sem constituírem um bloco de fundamentação epistemológica
homogênea, postulam posições algumas vezes não convergentes mas com um mesmo denominador
comum: o questionamento com base filosófica. Por caminhos diversos, manifestaram-
se desiludidos, como a grande maioria de intelectuais de sua época, com as transformações
do mundo em que viviam, questionando com ceticismo tanto a validade da
militância política quanto o desejo de autonomia e independência do pensamento.
Ao apontarem para a centralidade dada ao método no positivismo, procuram
observar o método para as ciências sociais sob outro ponto de vista. Ideologicamente
falando, os integrantes da Escola de Frankfurt constituíam um grupo de intelectuais
marxistas heterodoxos (...), no começo do século XX (HELOANI, 2007.p.2).
A análise de Fromm sobre o conceito de liberdade fundamenta-se
no contexto vivido pela sociedade da Alemanha, isto é, com a ascensão do regime
nazista, os participantes da escola, tentaram entender os regimes totalitários,
é o caso de Fromm, ao lançar as bases do medo
à liberdade, resultante, em grande parte, das consequências trazidas pelo
regime nazista na Alemanha. A Escola de Frankfurt[1],
além de abordar diferentes campos do saber, criou a chamada teoria freudomarxista. Foram poucos os
frankfurtianos que tentaram fazer uma união entre marxismo e psicanálise, o
caso de Fromm, revela-se especial, pois o autor, nas diferentes obras, tenta
mesclar as duas concepções. No entanto, a composição entre as duas correntes não
se dá, primeiramente, entendendo o marxismo pela psicanálise, ao contrário, entendendo
a psicanálise pelo marxismo. Nesse ponto, Fromm, além de utilizar diversos elementos
da psicanálise de Freud, também faz sua crítica,
Apesar de se
inspirar nesses pensadores, Fromm busca ir além deles e produzir sua própria concepção,
através da busca de síntese entre Marx e Freud. Porém, Fromm não poupa críticas
principalmente a Freud.(...) Podemos dizer que Fromm endereçou a Freud diversas
críticas. Podemos destacar, em primeiro lugar, a crítica metodológica; em segundo
lugar, a crítica do biologismo e pansexualismo; em terceiro lugar, a crítica política.
Estes três elementos não esgotam as divergências e críticas de Fromm a Freud (...).
(VIANA, 2010, p. 42-43).
Tratando de entender a teoria freudomarxista, pode-se, em linhas gerais, considerá-la como fruto
proeminente da Escola de Frankfurt, assim, entre suas principais características,
define-se que foi uma corrente que,
(...)
busca unir marxismo e psicanálise para fornecer uma explicação da sociedade.
(...) Há muito tempo esta junção vem sendo almejada no pensamento ocidental, desde
a Escola de Frankfurt, quando no final dos anos 1920 foi criada na Alemanha,
depois a derrota da tentativa de revolução proletária, gerou uma contrarrevolução.
Assim, buscou-se explicar o que alguns pensaram ser uma adesão da classe operária
alemã ao nazismo. Neste momento, alguns passaram a defender a importância da psicologia
social para a explicação do fenômeno nazista e outros fenômenos sociais.
Autores como Adorno, Fromm, Reich, Marcuse, entre outros, produziram trabalhos que
buscavam explicar o mecanismo psíquico do indivíduo na sociedade capitalista (VIANA,
2008, p. 13).
A partir do pensamento elaborado pela Escola de Frankfurt,
o autor em estudo, Fromm, desenvolve sua teoria, tanto do medo à liberdade, como uma das principais inovações de sua obra,
o conceito de inconsciente social, diferenciando, da proposta elaborada por Freud
sobre o inconsciente.
O medo à liberdade segundo o pensamento humanista de
Erich Fromm
Fromm, por ser psicanalista, não deixa de abordar a problemática
do medo à liberdade em termos eminentemente
psicológicos, ao mesmo tempo, tenta partir para análise material-histórica.
Pode-se ter um grado-geral, no qual podemos, explicitamente, observar as influências
de Fromm,
Erich
Fromm iniciou sua carreira de psicanalista na Alemanha. Ele foi um dos fundadores
do Instituto de Pesquisa de Frankfurt, de onde sairia o conjunto de pensadores
que foram identificados por pertencerem a "
Escola
de Frankfurt" (Marcuse, Benjamim, Adorno, Horkheimer, entre outros), mas foi
no período de ascensão do nazismo e sua ida para os Estados Unidos que ele começou
a produzir suas grandes obras, entre as quais, O Medo à Liberdade, Análise do Homem,
Psicanálise da Sociedade Contemporânea. (...) Fromm busca em Marx e na antropologia
moderna elementos de análise que permitiram a construção de uma concepção
histórica, social e cultural do ser humano (...). A síntese que Fromm irá realizar
entre as ideias de Freud e Marx é bastante interessante. Fromm irá recusar e
criticar várias teses de Freud e se desvencilhar de várias deformações da obra de
Marx, ou seja, do “marxismo positivista de Lênin, Bukhárin e outros" (VIANA,
2002, p. 31-32).
A teoria sobre o medo
à liberdade é, em linhas gerais, uma explicação para os regimes totalitários
que surgiram na Europa, principalmente, para o caso do nazismo, o qual Fromm
presenciou com toda a Escola de Frankfurt. Para Matos (1993), a questão do totalitarismo
será imprescindível para compreender a Teoria Crítica elaborada pela Escola de Frankfurt,
notando que “a ascensão do nazismo, a Segunda Guerra Mundial (...) foram os
fatores que marcaram a Teoria Crítica da Sociedade (MATOS,1993.p.67).
Estando em solo americano, desde 1934 em Nova York, Fromm
publicou seu primeiro livro[2]19
intitulado O medo á liberdade em
1941. Nesse livro, Fromm busca compreender o totalitarismo, como também, o conceito
de liberdade. Logo, no prefácio do seu livro, Fromm afirma que
A tese deste
livro é que o homem moderno, emancipado dos grilhões da sociedade pré-individualista
que simultaneamente lhe davam segurança e o cerceavam, não alcançou a liberdade
na acepção positiva de realização do seu eu individual: isto é, a manifestação
de suas potencialidades intelectuais, emocionais e sensoriais (FROMM, 1974, p.10).
Além disso,
como o conceito de individualização estaria circunstanciado a problemática de medo à liberdade? Como para alguns a liberdade
será um objetivo cobiçado e para outros uma ameaça, um peso enorme? É nesse sentido
que Fromm tenta explicar um dos principais problemas do mundo capitalista: o medo à liberdade. Para Fromm o conceito
de liberdade é histórico-material e não estático, portando, é mister considerar
que “a liberdade caracteriza a existência humana como tal e, outrossim, que seu
significado muda
de acordo com o grau com que o homem se percebe e concebe a si mesmo como um ser
independente e separado” (FROMM, 1974, p.29).
Desse modo, Fromm apresenta o que ele denominou de individuação, processo esse que,
historicamente, estaria concatenado ao conceito de liberdade. A individuação, como
o conceito de liberdade, mudaria com o passar das décadas, atingido, segundo
Fromm, seu ápice na história moderna com a instauração da sociedade capitalista.
Para exemplificar seu pensamento, Fromm relaciona seu conceito de liberdade e individuação
ao processo de nascimento e crescimento da criança. Observa-se que a criança,
ao nascer, permanece unida à mãe, mesmo depois da separação biológica.
Ela encontra-se protegida por elementos externos como o
cuidado da mãe, sendo alimentada, carregada e sendo cuidada, isso dará à criança
segurança e orientação. Esse aspecto que a criança encontra ao nascer, Fromm chama-os
de vínculos primários. Para Fromm, “eles
são orgânicos no sentido de fazerem parte do desenvolvimento humano normal;
implicam uma ausência de individualidade, mas também dão segurança e orientação
ao indivíduo” (FROMM, 1974, p.30). O processo de individuação é acelerado pela educação,
pelo egocentrismo que é típico das crianças e também pela submissão exacerbada aos
pais. Outros fatores que poderão ajudar a romper os vínculos primários e
desenvolver por completa a individuação é, primeiramente, o fortalecimento
físico, emocional da criança. O outro aspecto é a crescente solidão. À medida que
a criança vai quebrando os vínculos primários, ela fica separada dos vínculos que,
outrora, acobertava-a, portanto, começa a ficar sozinha. Assim, no momento que criança
percebe-se só no mundo, ela, enxerga-se capaz de fazer as coisas por si próprias,
sem a interferência de outrem. No entanto, ela deve, a partir de então,
enfrentar o mundo sozinho, com seus aspectos perigosos. Para Fromm, é nesse período,
que “surgem impulsos para se renunciar à própria individualidade, para superar
o sentimento de isolamento e de impotência (...)” (FROMM, 1974, p. 33) Nesse sentido,
a liberdade tem um significado diverso daquele que possuía antes.
Como podemos perceber, ao analisar o processo de individuação
e, igualmente, o desvencilhamento dos vínculos primários, a criança passa por um
longo período até atingir
o
estágio supremo de individuação. Para chegar a esse ponto, foi necessário a criança
emancipar-se dos grilhões que a controlava, para que assim, pudesse de maneira autônoma,
tornar-se, por fim,
livre. Não obstante,
Fromm tentará, em
sua obra, relacionar
filogeneticamente
o processo de individuação à história do homem, apontando para isso, dois períodos
da história humana: a idade média com as relações, tipicamente, feudais e,
também, a idade moderna com a ascensão do regime capitalista.
Nesse ínterim, Fromm faz uma dicotomização do conceito
de liberdade, segundo suas palavras, “(...) a liberdade é aqui empregada não em
seu sentido positivo de “liberdade para, porém no negativo de “liberdade de”, ou
seja, liberdade da determinação instintiva de suas ações (...) “Liberdade de” não
é a mesma coisa que liberdade positiva, “liberdade para” (FROMM, 1974, p. 35-37).
Resta desse modo, identificar quais das liberdades são
existentes em nossa sociedade capitalista. Ao comentar as implicações do conceito
de liberdade em Fromm, afirma Santos,
(... ) a
diferença entre a “liberdade de” e a “liberdade para”, sendo a primeira a
liberdade existente também na sociedade capitalista que segundo o autor uma pseudoliberdade,
e a segunda seria a realização da liberdade no sentido do homem se livrar das ideologias
que o aprisionaram ao longo da história, bem como na sociedade capitalista (SANTOS,
2010, p.19).
Na história, segundo Fromm, o indivíduo surge durante
os movimentos modernos, como o Renascimento e, principalmente, com o capitalismo.
Assim, no período moderno, uma nova concepção de liberdade foi criada, encontrando
solo fértil em novas doutrinas religiosas, como a Reforma. Nesse sentido, como
era a liberdade na sociedade medieval, ou, se existia a noção de indivíduo? Para
Fromm, o que diferencia a sociedade medieval da moderna, baseia-se em que, no período
do medievo, não existia liberdade. Corroborando sua argumentação, Fromm, tenta
mostrar como a Idade Média as pessoas, em sua maioria, não tinham possibilidade
de mudar de uma classe para outra, não se podia sequer mudar geograficamente de
um país para outro. Além disso, a vida em vários aspectos, como econômico e social
era controlada por regras e coerções advindas, ora da Igreja, ora do poder monárquico.
Ainda, segundo Santos
A
sociedade medieval existia um sistema de pensamento fechado, articulado no qual
o indivíduo estava integrado com o meio que lhe proporcionava uma relativa estabilidade,
diferente da sociedade capitalista quando aparece o “indivíduo” emancipado, pois alterou-se a estrutura das classes, iniciando
o que Marx denominou a luta entre o proletariado e a burguesia (Marx 1998) (SANTOS,
2010, p. 19).
A partir dessas constatações, observamos que, durante o
período medieval, não existia o indivíduo, conforme a acepção moderna do termo.
Fromm, nesse ponto assinala que “o homem estava ainda relacionado com o mundo pelos
vínculos primários. Ele ainda não se concebia como indivíduo, salvo através de
seu papel social (que era então, igualmente, seu papel natural” (Fromm, 1974, p.43).
Portando, o ser humano no medievo é, dessa forma, comparado à criança logo ao nascer,
precisando, desde cedo, de cuidados, em outras palavras, a sociedade medieval
representa a não-individualização do ser humano, consequentemente, a não-liberdade.
Em contraposição a isso, o início da modernidade pode, contudo, desenvolver a noção
de indivíduo. Os grilhões que outrora cercavam o ser humano foram quebrados, agora,
mais do que nunca, poder-se-ia desenvolver sua liberdade. No entanto, é nesse momento
que o ser humano tem tudo, mas, ao mesmo tempo, surge o medo à liberdade.
Do mesmo modo que a criança, ao atingir o ápice da individualização,
o ser humano fica sozinho no mundo, tendo que enfrentar de todos os lados perigos
eminentes. Segundo Fromm
(...) a
nova liberdade trouxe consigo duas coisas para eles: um maior sentimento de
força e, ao mesmo tempo, maior isolamento, dúvida, ceticismo e - oriunda de tudo
isso - mais angústia. É a mesma contradição que encontramos nas obras filosóficas
dos humanistas. Lado a lado com seu realce revelam insegurança e desespero em sua
filosofia (FROMM, 1974, p. 48).
Fromm também aponta que,
(...)
o capitalismo libertou o indivíduo. Ele libertou o homem da arregimentação do sistema
corporativo; permitiu-lhe firmar-se nos próprios pés e experimentar sua sorte (...)
O indivíduo está livre da opressão dos grilhões econômicos e políticos (...)
Mas simultaneamente está livre daqueles vínculos que costumavam dar-lhe segurança
e uma sensação de relacionamento (FROMM, 1974, p. 58).
Ao deparar com isso, o indivíduo moderno foi deixado só,
tendo que fazer tudo ao seu próprio esforço, sem ninguém para ajudá-lo. A liberdade,
portando, começa a ter um sentido negativo, na qual os seres humanos não conseguem
conviver, surge então, o medo à liberdade.
O indivíduo pode emancipar-se dos grilhões que, outrora, controlava-o. Mas simultaneamente
ele ficou livre, como a criança, dos vínculos (primários) que costumavam dar-lhe
segurança e sensação de relacionamento. A liberdade deixa-o isolado tendo que
enfrentar
o mundo sozinho. Assim, a liberdade adquire, então, um significado negativo, levando
a destruição da personalidade. A liberdade torna-se um fardo demais pesado para
o homem suportar, levando-o a ter, o medo
à liberdade.
A análise que Fromm faz sobre do medo à liberdade é insatisfatória
em certos pontos. Ao produzir sua teoria sobre a liberdade, Fromm, não consegue
detectar que para se efetivar a liberdade em seu sentido positivo é necessário,
antes de tudo, abolir a sociedade que gera o medo à liberdade, isto é, a sociedade
capitalista marcada pela luta de classes. Na concepção de Santos,
O
autor devido ao seu humanismo abstrato, tendência que se assemelha a uma
solidariedade com as classes exploradas e, não perceber que o fundamental é lutar
pela transformação social e que a superação dos males dessa sociedade passa
necessariamente pela superação da sociedade capitalista (SANTOS, 2010, p. 18).
Portanto, a limitação conceitual de Fromm baseia-se em
não reconhecer que a sociedade capitalista é quem produz o medo à liberdade, como também, apresenta da mesma forma, as coibições
para se efetivar o projeto de liberdade para,
segundo o termo cunhado por Fromm. No mesmo sentido, Viana assinala a
importância do pensamento de Fromm, que “faz um diagnóstico crítico da sociedade
capitalista, embora se perca quando tenta apresentar soluções dentro do capitalismo
o qual, segundo ele mesmo, gera uma sociedade alienada. (VIANA, 2008, p.13). Assim,
Fromm se perde em não reconhecer que a sociedade capitalista é, paradoxalmente,
o principal obstáculo para a realização da liberdade. No pensamento de Marx podemos,
em alguns pontos, entender a razão da não- liberdade no sistema capitalista, pois,
Procurando
seu próprio espaço entre Hegel e Feuerbach, Marx busca apreender a liberdade a partir
da base concreta das relações materiais, entretanto, encalha no modelo fenomenológico
da autoconsciência. (...) Valendo-se da crítica a Proudhon, Marx atinge o refinamento
metodológico que possibilitar-lhe-á uma abordagem filosoficamente mais consistente
do problema da liberdade, através da exploração do potencial crítico de uma
forma de exposição fundada em modelo de autoconstituição.(...) N'O Capital, a exposição
do sistema capitalista enquanto totalidade concreta — síntese de múltiplas
determinações — revela que as condições de possibilidade da confirmação do capital
como princípio onímodo de síntese social são o desaparecimento da liberdade substancial
do plano do discurso explícito — ao mesmo tempo em que se mantém a aparência de
uma liberdade abstrata — e a consequente efetivação da não-liberdade (OLIVEIRA, 1998, p. 188-191).
Para Marx, a realização da liberdade não ocorreu devido
o trabalhador ser livre, para vender somente seu trabalho que, em decorrência
do capitalismo, torna-se, trabalho alienado. Nas palavras de Marx,
Todas essas
consequências decorrem do fato de o trabalhador ser relacionado com produto de seu
trabalho como com um objeto alienado. (...) A alienação do trabalhador em seu produto
não significa apenas que o trabalho dele se converte em objeto, assumindo uma existência
externa, mas ainda que existe independente, fora dele mesmo, e a ele estranho, e
que se lhe opõe como uma força autônoma (MARX, 1983, p. 91).
Desse modo, considera-se que a liberdade no sistema capitalista
é, portando, uma pseudoliberdade,
(...)
posta pela sociedade capitalista é uma falsa liberdade, pois é uma liberdade
puramente formal e abstrata. O trabalhador aparece como homem livre no mercado de
trabalho unicamente porque antes todos os meios objetivos para o processo foram
convertidos em propriedade do não trabalhador (...). Mas trabalhador livre para
Marx é trabalhador destituído de todos os meios objetivos de realização de sua
humanidade como trabalhador (...) (ANTUNES, 2009, p. 91).
Em decorrência de não reconhecer, numa perspectiva marxista,
que o indivíduo é livre, mas somente para vender sua força de trabalho, Fromm, cai
no malogro de somente apresentar a sociedade capitalista, mas, não vê, nesse mesma
sociedade , que a superação do medo à liberdade
consiste, portando, em extirpá-la, através da autogestão social[3].
Mesmo assim, pode-se considerar que a obra de Fromm constitui um marco importante
para se pensar a liberdade, tendo um conteúdo pertinente e válido.
Referências
ANTUNES, Jadir. Marx e as noções de progresso, liberdade e sujeito
na história. [On-line] 2009. Disponibilidade:
.Acesso: abril de 2011.
FROMM, Erich. O medo à Liberdade.
Rio de Janeiro: Zahar,1974.
HELOANI, Roberto. A valorização da reflexão: o melhor antídoto
contra o dogmatismo. [On- line] 2007. Disponibilidade: http://www.sepq.org.br/IIsipeq/anais/pdf/gt4/05.pdf
.Acesso: abril de 2011.
MATOS, Olgária C. F. A Escola de Frankfurt: luzes e sombras do Iluminismo.
São Paulo: Moderna, 1993.
MARX, Karl. Manuscritos Econômico-
Filosóficos. In: FROMM, Erich. O Conceito
Marxista do Homem. 8a edição, Rio de Janeiro: Zahar, 1983.
OLIVEIRA, Avelino da Rosa. O problema da liberdade no pensamento de Karl
Marx. [On-line] 1998. Florianópolis: Revista Perspectiva. Disponibilidade:
http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/10638/10171. Acesso: abril de 2011.
SANTOS, André de Melo. Reflexões sobre as implicações do conceito de
liberdade em Erich Fromm. Revista Espaço Acadêmico. Disponível em:
http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/10506/5772.
Acesso em: abril de 2011.
VIANA, Nildo. Universo Psíquico e Reprodução do Capital:
ensaios freudo-marxistas. São Paulo: Escuta, 2008.
. Inconsciente
coletivo e Materialismo Histórico. Goiânia: Germial, 2002.
. Fromm crítico de Freud. [On-line]2010. Revista Espaço Acadêmico. Disponibilidade: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/10501/5776 .
Acesso: Acesso: abril de 2011.
. Manifesto Autogestionário.
Rio de Janeiro: Achiamé, 2008.
[1]
A Escola de Frankfurt, pode ser dividida em três
momentos básicos, segundo Heloani (2007): no primeiro, período de antes e
durante a Segunda Guerra Mundial, época da perseguição nazista, Horkheimer
exerce a principal influência sobre o andamento dos trabalhos. No segundo,
Adorno assume a direção intelectual do Instituto, introduz o tema da cultura e
desenvolvimento em sua teoria estética, uma versão especial da teoria crítica.
Já no terceiro momento, a liderança passa a Habermas que, pela discussão da
crítica, buscará com sua teoria da ação comunicativa uma saída para os impasses
criados por Horkheimer e Adorno, por meio da proposta de um novo paradigma: o
da razão comunicativa. (HELOANI, 2007.p.3)
[2]
Deve-se observar, todavia, que a obra em que Fromm
vai defender sua tese sobre o medo a
liberdade é uma concepção a priori do
conceito de liberdade, especialmente, por que a primeira obra editada e
publicada de Fromm é o livro intitulado de O
medo à Liberdade , tendo sua primeira edição em 1941. Desse modo, alguns
conceitos apresentados na obra, como o de liberdade, não resultam de um
amadurecimento teórico e, às vezes, deixam por desejar nas incongruências
analíticas.
-----------------------------------
Publicado originalmente na Revista Enfrentamento:
http://redelp.net/revistas/index.php/enf/article/view/880/pdf_53
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