sábado, 20 de julho de 2019

O medo à liberdade no pensamento humanista de Erich Fromm

O MEDO À LIBERDADE NO PENSAMENTO HUMANISTA DE ERICH FROMM


Alan Ricardo Duarte Pereira*

O presente trabalho tem como objetivo analisar o medo à liberdade conforme foi conceitualizado e teorizado por Erich Fromm (1900-1980). E, de forma sucinta, buscaremos expor as concepções teórico-metodológicas de Fromm. Para isso, visamos analisar uma das principais obras que Erich Fromm expõe minuciosamente a problemática da liberdade, cognominada de O medo à liberdade. Num primeiro momento, buscaremos expor o contexto histórico-político de Fromm, juntamente com a Escola de Frankfurt, depois partiremos para a análise que o autor faz do conceito de liberdade e, por fim, destacaremos as problemáticas e implicações em torno do medo à liberdade na sociedade capitalista.
O psicanalista Erich Fromm tem uma obra vasta sobre psicanálise e marxismo, entre esse obras temos, principalmente, Análise do Homem, Conceito marxista do Homem, O coração do Homem , A crise da Psicanálise, Meu encontro com Marx e Freud, A missão de Freud , Psicanálise da Sociedade Contemporânea , além dessas obras existem duas tratando- se do conceito de liberdade, O Espírito da Liberdade e O medo à liberdade. As duas últimas obras, neste artigo, serão resgatadas- e principalmente a obra O medo à liberdade - para analisarmos o conceito de liberdade em Fromm.

A escola de Frankfurt e a teoria crítica

Primeiramente, para que se entenda as reflexões de Fromm sobre o conceito de liberdade, tornar-se-á necessário buscar suas fundamentações na chamada Escola de Frankfurt. O instituto foi fundado na cidade de Frankfurt, na Alemanha, em 1923, ligado à Universidade de Frankfurt. Os integrantes dessa escola foram Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Herbert Marcuse, Walter Benjamin, Erich Fromm, entre outros. Essa escola buscou preencher algumas lacunas do marxismo tradicional, “extraindo” suas teorias dos mais diversos campos (psicanálise, filosofia, existencialismo, sociologia, história), sintetizando trabalhos como de Hegel, Kant, Lukács e principalmente, de Marx e Freud. Criaram, assim, o

 que foi considerado de “Teoria Crítica da sociedade”. Conforme aponta Matos (1993) em seu livro sobre a Escola de Frankfurt, “a Teoria Crítica realiza uma incorporação do pensamento de filósofos “tradicionais”, colocando-os em tensão com o mundo presente” (MATOS, 1993, p.13).
É importante observar que essa mesma escola não somente refutou as obras de alguns autores, mas, simultaneamente, incorporou uma gama de pensamentos, reformulando, por sua vez, as abordagens tradicionais, assim, pode-se considerar que os
Membros filiados a essa escola objetivaram realizar uma sistemática crítica ao positivismo e à racionalidade iluminista. Sem constituírem um bloco de fundamentação epistemológica homogênea, postulam posições algumas vezes não convergentes mas com um mesmo denominador comum: o questionamento com base filosófica. Por caminhos diversos, manifestaram- se desiludidos, como a grande maioria de intelectuais de sua época, com as transformações do mundo em que viviam, questionando com ceticismo tanto a validade da militância política quanto o desejo de autonomia e independência do pensamento. Ao apontarem para a centralidade dada ao método no positivismo, procuram observar o método para as ciências sociais sob outro ponto de vista. Ideologicamente falando, os integrantes da Escola de Frankfurt constituíam um grupo de intelectuais marxistas heterodoxos (...), no começo do século XX (HELOANI, 2007.p.2).

A análise de Fromm sobre o conceito de liberdade fundamenta-se no contexto vivido pela sociedade da Alemanha, isto é, com a ascensão do regime nazista, os participantes da escola, tentaram entender os regimes totalitários, é o caso de Fromm, ao lançar as bases do medo à liberdade, resultante, em grande parte, das consequências trazidas pelo regime nazista na Alemanha. A Escola de Frankfurt[1], além de abordar diferentes campos do saber, criou a chamada teoria freudomarxista. Foram poucos os frankfurtianos que tentaram fazer uma união entre marxismo e psicanálise, o caso de Fromm, revela-se especial, pois o autor, nas diferentes obras, tenta mesclar as duas concepções. No entanto, a composição entre as duas correntes não se dá, primeiramente, entendendo o marxismo pela psicanálise, ao contrário, entendendo a psicanálise pelo marxismo. Nesse ponto, Fromm, além de utilizar diversos elementos da psicanálise de Freud, também faz sua crítica,
Apesar de se inspirar nesses pensadores, Fromm busca ir além deles e produzir sua própria concepção, através da busca de síntese entre Marx e Freud. Porém, Fromm não poupa críticas principalmente a Freud.(...) Podemos dizer que Fromm endereçou a Freud diversas críticas. Podemos destacar, em primeiro lugar, a crítica metodológica; em segundo lugar, a crítica do biologismo e pansexualismo; em terceiro lugar, a crítica política. Estes três elementos não esgotam as divergências e críticas de Fromm a Freud (...). (VIANA, 2010, p. 42-43).

Tratando de entender a teoria freudomarxista, pode-se, em linhas gerais, considerá-la como fruto proeminente da Escola de Frankfurt, assim, entre suas principais características, define-se que foi uma corrente que,
(...) busca unir marxismo e psicanálise para fornecer uma explicação da sociedade. (...) Há muito tempo esta junção vem sendo almejada no pensamento ocidental, desde a Escola de Frankfurt, quando no final dos anos 1920 foi criada na Alemanha, depois a derrota da tentativa de revolução proletária, gerou uma contrarrevolução. Assim, buscou-se explicar o que alguns pensaram ser uma adesão da classe operária alemã ao nazismo. Neste momento, alguns passaram a defender a importância da psicologia social para a explicação do fenômeno nazista e outros fenômenos sociais. Autores como Adorno, Fromm, Reich, Marcuse, entre outros, produziram trabalhos que buscavam explicar o mecanismo psíquico do indivíduo na sociedade capitalista (VIANA, 2008, p. 13).

A partir do pensamento elaborado pela Escola de Frankfurt, o autor em estudo, Fromm, desenvolve sua teoria, tanto do medo à liberdade, como uma das principais inovações de sua obra, o conceito de inconsciente social, diferenciando, da proposta elaborada por Freud sobre o inconsciente.

O medo à liberdade segundo o pensamento humanista de Erich Fromm

 Fromm, por ser psicanalista, não deixa de abordar a problemática do medo à liberdade em termos eminentemente psicológicos, ao mesmo tempo, tenta partir para análise material-histórica. Pode-se ter um grado-geral, no qual podemos, explicitamente, observar as influências de Fromm,
Erich Fromm iniciou sua carreira de psicanalista na Alemanha. Ele foi um dos fundadores do Instituto de Pesquisa de Frankfurt, de onde sairia o conjunto de pensadores que foram identificados por pertencerem a "


Escola de Frankfurt" (Marcuse, Benjamim, Adorno, Horkheimer, entre outros), mas foi no período de ascensão do nazismo e sua ida para os Estados Unidos que ele começou a produzir suas grandes obras, entre as quais, O Medo à Liberdade, Análise do Homem, Psicanálise da Sociedade Contemporânea. (...) Fromm busca em Marx e na antropologia moderna elementos de análise que permitiram a construção de uma concepção histórica, social e cultural do ser humano (...). A síntese que Fromm irá realizar entre as ideias de Freud e Marx é bastante interessante. Fromm irá recusar e criticar várias teses de Freud e se desvencilhar de várias deformações da obra de Marx, ou seja, do “marxismo positivista de Lênin, Bukhárin e outros" (VIANA, 2002, p. 31-32).

A teoria sobre o medo à liberdade é, em linhas gerais, uma explicação para os regimes totalitários que surgiram na Europa, principalmente, para o caso do nazismo, o qual Fromm presenciou com toda a Escola de Frankfurt. Para Matos (1993), a questão do totalitarismo será imprescindível para compreender a Teoria Crítica elaborada pela Escola de Frankfurt, notando que “a ascensão do nazismo, a Segunda Guerra Mundial (...) foram os fatores que marcaram a Teoria Crítica da Sociedade (MATOS,1993.p.67).
Estando em solo americano, desde 1934 em Nova York, Fromm publicou seu primeiro livro[2]19 intitulado O medo á liberdade em 1941. Nesse livro, Fromm busca compreender o totalitarismo, como também, o conceito de liberdade. Logo, no prefácio do seu livro, Fromm afirma que
A tese deste livro é que o homem moderno, emancipado dos grilhões da sociedade pré-individualista que simultaneamente lhe davam segurança e o cerceavam, não alcançou a liberdade na acepção positiva de realização do seu eu individual: isto é, a manifestação de suas potencialidades intelectuais, emocionais e sensoriais (FROMM, 1974, p.10).
Além disso, como o conceito de individualização estaria circunstanciado a problemática de medo à liberdade? Como para alguns a liberdade será um objetivo cobiçado e para outros uma ameaça, um peso enorme? É nesse sentido que Fromm tenta explicar um dos principais problemas do mundo capitalista: o medo à liberdade. Para Fromm o conceito de liberdade é histórico-material e não estático, portando, é mister considerar que “a liberdade caracteriza a existência humana como tal e, outrossim, que seu significado muda

 de acordo com o grau com que o homem se percebe e concebe a si mesmo como um ser
independente e separado” (FROMM, 1974, p.29).
Desse modo, Fromm apresenta o que ele denominou de individuação, processo esse que, historicamente, estaria concatenado ao conceito de liberdade. A individuação, como o conceito de liberdade, mudaria com o passar das décadas, atingido, segundo Fromm, seu ápice na história moderna com a instauração da sociedade capitalista. Para exemplificar seu pensamento, Fromm relaciona seu conceito de liberdade e individuação ao processo de nascimento e crescimento da criança. Observa-se que a criança, ao nascer, permanece unida à mãe, mesmo depois da separação biológica.
Ela encontra-se protegida por elementos externos como o cuidado da mãe, sendo alimentada, carregada e sendo cuidada, isso dará à criança segurança e orientação. Esse aspecto que a criança encontra ao nascer, Fromm chama-os de vínculos primários. Para Fromm, “eles são orgânicos no sentido de fazerem parte do desenvolvimento humano normal; implicam uma ausência de individualidade, mas também dão segurança e orientação ao indivíduo” (FROMM, 1974, p.30). O processo de individuação é acelerado pela educação, pelo egocentrismo que é típico das crianças e também pela submissão exacerbada aos pais. Outros fatores que poderão ajudar a romper os vínculos primários e desenvolver por completa a individuação é, primeiramente, o fortalecimento físico, emocional da criança. O outro aspecto é a crescente solidão. À medida que a criança vai quebrando os vínculos primários, ela fica separada dos vínculos que, outrora, acobertava-a, portanto, começa a ficar sozinha. Assim, no momento que criança percebe-se só no mundo, ela, enxerga-se capaz de fazer as coisas por si próprias, sem a interferência de outrem. No entanto, ela deve, a partir de então, enfrentar o mundo sozinho, com seus aspectos perigosos. Para Fromm, é nesse período, que “surgem impulsos para se renunciar à própria individualidade, para superar o sentimento de isolamento e de impotência (...)” (FROMM, 1974, p. 33) Nesse sentido, a liberdade tem um significado diverso daquele que possuía antes.
Como podemos perceber, ao analisar o processo de individuação e, igualmente, o desvencilhamento dos vínculos primários, a criança passa por um longo período até atingir
o estágio supremo de individuação. Para chegar a esse ponto, foi necessário a criança emancipar-se dos grilhões que a controlava, para que assim, pudesse de maneira autônoma, tornar-se,  por  fim,  livre.   Não  obstante,  Fromm  tentará,  em  sua  obra, relacionar


filogeneticamente o processo de individuação à história do homem, apontando para isso, dois períodos da história humana: a idade média com as relações, tipicamente, feudais e, também, a idade moderna com a ascensão do regime capitalista.
Nesse ínterim, Fromm faz uma dicotomização do conceito de liberdade, segundo suas palavras, “(...) a liberdade é aqui empregada não em seu sentido positivo de “liberdade para, porém no negativo de “liberdade de”, ou seja, liberdade da determinação instintiva de suas ações (...) “Liberdade de” não é a mesma coisa que liberdade positiva, “liberdade para” (FROMM, 1974, p. 35-37).
Resta desse modo, identificar quais das liberdades são existentes em nossa sociedade capitalista. Ao comentar as implicações do conceito de liberdade em Fromm, afirma Santos,
(... ) a diferença entre a “liberdade de” e a “liberdade para”, sendo a primeira a liberdade existente também na sociedade capitalista que segundo o autor uma pseudoliberdade, e a segunda seria a realização da liberdade no sentido do homem se livrar das ideologias que o aprisionaram ao longo da história, bem como na sociedade capitalista (SANTOS, 2010, p.19).

Na história, segundo Fromm, o indivíduo surge durante os movimentos modernos, como o Renascimento e, principalmente, com o capitalismo. Assim, no período moderno, uma nova concepção de liberdade foi criada, encontrando solo fértil em novas doutrinas religiosas, como a Reforma. Nesse sentido, como era a liberdade na sociedade medieval, ou, se existia a noção de indivíduo? Para Fromm, o que diferencia a sociedade medieval da moderna, baseia-se em que, no período do medievo, não existia liberdade. Corroborando sua argumentação, Fromm, tenta mostrar como a Idade Média as pessoas, em sua maioria, não tinham possibilidade de mudar de uma classe para outra, não se podia sequer mudar geograficamente de um país para outro. Além disso, a vida em vários aspectos, como econômico e social era controlada por regras e coerções advindas, ora da Igreja, ora do poder monárquico. Ainda, segundo Santos
A sociedade medieval existia um sistema de pensamento fechado, articulado no qual o indivíduo estava integrado com o meio que lhe proporcionava uma relativa estabilidade, diferente da sociedade capitalista quando aparece o “indivíduo” emancipado, pois alterou-se a estrutura das classes, iniciando o que Marx denominou a luta entre o proletariado e a burguesia (Marx 1998) (SANTOS, 2010, p. 19).


A partir dessas constatações, observamos que, durante o período medieval, não existia o indivíduo, conforme a acepção moderna do termo. Fromm, nesse ponto assinala que “o homem estava ainda relacionado com o mundo pelos vínculos primários. Ele ainda não se concebia como indivíduo, salvo através de seu papel social (que era então, igualmente, seu papel natural” (Fromm, 1974, p.43). Portando, o ser humano no medievo é, dessa forma, comparado à criança logo ao nascer, precisando, desde cedo, de cuidados, em outras palavras, a sociedade medieval representa a não-individualização do ser humano, consequentemente, a não-liberdade. Em contraposição a isso, o início da modernidade pode, contudo, desenvolver a noção de indivíduo. Os grilhões que outrora cercavam o ser humano foram quebrados, agora, mais do que nunca, poder-se-ia desenvolver sua liberdade. No entanto, é nesse momento que o ser humano tem tudo, mas, ao mesmo tempo, surge o medo à liberdade.
Do mesmo modo que a criança, ao atingir o ápice da individualização, o ser humano fica sozinho no mundo, tendo que enfrentar de todos os lados perigos eminentes. Segundo Fromm
(...) a nova liberdade trouxe consigo duas coisas para eles: um maior sentimento de força e, ao mesmo tempo, maior isolamento, dúvida, ceticismo e - oriunda de tudo isso - mais angústia. É a mesma contradição que encontramos nas obras filosóficas dos humanistas. Lado a lado com seu realce revelam insegurança e desespero em sua filosofia (FROMM, 1974, p. 48).

Fromm também aponta que,
(...) o capitalismo libertou o indivíduo. Ele libertou o homem da arregimentação do sistema corporativo; permitiu-lhe firmar-se nos próprios pés e experimentar sua sorte (...) O indivíduo está livre da opressão dos grilhões econômicos e políticos (...) Mas simultaneamente está livre daqueles vínculos que costumavam dar-lhe segurança e uma sensação de relacionamento (FROMM, 1974, p. 58).

Ao deparar com isso, o indivíduo moderno foi deixado só, tendo que fazer tudo ao seu próprio esforço, sem ninguém para ajudá-lo. A liberdade, portando, começa a ter um sentido negativo, na qual os seres humanos não conseguem conviver, surge então, o medo à liberdade. O indivíduo pode emancipar-se dos grilhões que, outrora, controlava-o. Mas simultaneamente ele ficou livre, como a criança, dos vínculos (primários) que costumavam dar-lhe segurança e sensação de relacionamento. A liberdade deixa-o isolado tendo que


enfrentar o mundo sozinho. Assim, a liberdade adquire, então, um significado negativo, levando a destruição da personalidade. A liberdade torna-se um fardo demais pesado para o homem suportar, levando-o a ter, o medo à liberdade.
A análise que Fromm faz sobre do medo à liberdade é insatisfatória em certos pontos. Ao produzir sua teoria sobre a liberdade, Fromm, não consegue detectar que para se efetivar a liberdade em seu sentido positivo é necessário, antes de tudo, abolir a sociedade que gera o medo à liberdade, isto é, a sociedade capitalista marcada pela luta de classes. Na concepção de Santos,
O autor devido ao seu humanismo abstrato, tendência que se assemelha a uma solidariedade com as classes exploradas e, não perceber que o fundamental é lutar pela transformação social e que a superação dos males dessa sociedade passa necessariamente pela superação da sociedade capitalista (SANTOS, 2010, p. 18).

Portanto, a limitação conceitual de Fromm baseia-se em não reconhecer que a sociedade capitalista é quem produz o medo à liberdade, como também, apresenta da mesma forma, as coibições para se efetivar o projeto de liberdade para, segundo o termo cunhado por Fromm. No mesmo sentido, Viana assinala a importância do pensamento de Fromm, que “faz um diagnóstico crítico da sociedade capitalista, embora se perca quando tenta apresentar soluções dentro do capitalismo o qual, segundo ele mesmo, gera uma sociedade alienada. (VIANA, 2008, p.13). Assim, Fromm se perde em não reconhecer que a sociedade capitalista é, paradoxalmente, o principal obstáculo para a realização da liberdade. No pensamento de Marx podemos, em alguns pontos, entender a razão da não- liberdade no sistema capitalista, pois,
Procurando seu próprio espaço entre Hegel e Feuerbach, Marx busca apreender a liberdade a partir da base concreta das relações materiais, entretanto, encalha no modelo fenomenológico da autoconsciência. (...) Valendo-se da crítica a Proudhon, Marx atinge o refinamento metodológico que possibilitar-lhe-á uma abordagem filosoficamente mais consistente do problema da liberdade, através da exploração do potencial crítico de uma forma de exposição fundada em modelo de autoconstituição.(...) N'O Capital, a exposição do sistema capitalista enquanto totalidade concreta — síntese de múltiplas determinações — revela que as condições de possibilidade da confirmação do capital como princípio onímodo de síntese social são o desaparecimento da liberdade substancial do plano do discurso explícito — ao mesmo tempo em que se mantém a aparência de uma liberdade abstrata — e a consequente efetivação da não-liberdade (OLIVEIRA, 1998, p. 188-191).


Para Marx, a realização da liberdade não ocorreu devido o trabalhador ser livre, para vender somente seu trabalho que, em decorrência do capitalismo, torna-se, trabalho alienado. Nas palavras de Marx,
Todas essas consequências decorrem do fato de o trabalhador ser relacionado com produto de seu trabalho como com um objeto alienado. (...) A alienação do trabalhador em seu produto não significa apenas que o trabalho dele se converte em objeto, assumindo uma existência externa, mas ainda que existe independente, fora dele mesmo, e a ele estranho, e que se lhe opõe como uma força autônoma (MARX, 1983, p. 91).

Desse modo, considera-se que a liberdade no sistema capitalista é, portando, uma pseudoliberdade,
(...) posta pela sociedade capitalista é uma falsa liberdade, pois é uma liberdade puramente formal e abstrata. O trabalhador aparece como homem livre no mercado de trabalho unicamente porque antes todos os meios objetivos para o processo foram convertidos em propriedade do não trabalhador (...). Mas trabalhador livre para Marx é trabalhador destituído de todos os meios objetivos de realização de sua humanidade como trabalhador (...) (ANTUNES, 2009, p. 91).

Em decorrência de não reconhecer, numa perspectiva marxista, que o indivíduo é livre, mas somente para vender sua força de trabalho, Fromm, cai no malogro de somente apresentar a sociedade capitalista, mas, não vê, nesse mesma sociedade , que a superação do medo à liberdade consiste, portando, em extirpá-la, através da autogestão social[3]. Mesmo assim, pode-se considerar que a obra de Fromm constitui um marco importante para se pensar a liberdade, tendo um conteúdo pertinente e válido.

Referências

ANTUNES, Jadir. Marx e as noções de progresso, liberdade e sujeito na história. [On-line] 2009. Disponibilidade:
.Acesso: abril de 2011.
FROMM, Erich. O medo à Liberdade. Rio de Janeiro: Zahar,1974.
HELOANI, Roberto. A valorização da reflexão: o melhor antídoto contra o dogmatismo. [On- line] 2007. Disponibilidade: http://www.sepq.org.br/IIsipeq/anais/pdf/gt4/05.pdf .Acesso: abril de 2011.



MATOS, Olgária C. F. A Escola de Frankfurt: luzes e sombras do Iluminismo. São Paulo: Moderna, 1993.
MARX, Karl. Manuscritos Econômico- Filosóficos. In: FROMM, Erich. O Conceito Marxista do Homem. 8a edição, Rio de Janeiro: Zahar, 1983.
OLIVEIRA, Avelino da Rosa. O problema da liberdade no pensamento de Karl Marx. [On-line] 1998. Florianópolis: Revista Perspectiva. Disponibilidade:
SANTOS, André de Melo. Reflexões sobre as implicações do conceito de liberdade em Erich Fromm. Revista Espaço Acadêmico. Disponível em:
VIANA, Nildo. Universo Psíquico e Reprodução do Capital: ensaios freudo-marxistas. São Paulo: Escuta, 2008.
                  . Inconsciente coletivo e Materialismo Histórico. Goiânia: Germial, 2002.
                .    Fromm    crítico    de    Freud.    [On-line]2010.    Revista    Espaço    Acadêmico. Disponibilidade: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/10501/5776                . Acesso: Acesso: abril de 2011.
                . Manifesto Autogestionário. Rio de Janeiro: Achiamé, 2008.



* Graduando em História pela Universidade Federal de Goiás.
[1] A Escola de Frankfurt, pode ser dividida em três momentos básicos, segundo Heloani (2007): no primeiro, período de antes e durante a Segunda Guerra Mundial, época da perseguição nazista, Horkheimer exerce a principal influência sobre o andamento dos trabalhos. No segundo, Adorno assume a direção intelectual do Instituto, introduz o tema da cultura e desenvolvimento em sua teoria estética, uma versão especial da teoria crítica. Já no terceiro momento, a liderança passa a Habermas que, pela discussão da crítica, buscará com sua teoria da ação comunicativa uma saída para os impasses criados por Horkheimer e Adorno, por meio da proposta de um novo paradigma: o da razão comunicativa. (HELOANI, 2007.p.3)
[2] Deve-se observar, todavia, que a obra em que Fromm vai defender sua tese sobre o medo a liberdade é uma concepção a priori do conceito de liberdade, especialmente, por que a primeira obra editada e publicada de Fromm é o livro intitulado de O medo à Liberdade , tendo sua primeira edição em 1941. Desse modo, alguns conceitos apresentados na obra, como o de liberdade, não resultam de um amadurecimento teórico e, às vezes, deixam por desejar nas incongruências analíticas.
[3] A autogestão, conforme empregada aqui é o meio para emancipação do ser humano, e,  igualmente,  a liberdade do indivíduo, abolindo, por sua vez, o mercado e o Estado. Portanto, “A autogestão é, assim, uma relação de produção e não como nas ideologias burguesas, mera forma de gestão de empresas, ou simplesmente democracia direta (VIANA, 2008, p. 78).
-----------------------------------
Publicado originalmente na Revista Enfrentamento:
http://redelp.net/revistas/index.php/enf/article/view/880/pdf_53 

Nenhum comentário:

Postar um comentário